Bem-vindos ao Módulo 5: “Hemovigilância, comitês transfusionais e núcleo de segurança do paciente!
Este módulo finaliza a UA II “Processo de trabalho”, permitindo que você conheça e compreenda as ferramentas de monitoramento e melhoria das práticas hemoterápicas nos serviços de saúde, por meio de casos clínicos e textos de apoio.
Inicialmente, dentro do processo de hemovigilância, serão tratados o diagnóstico das reações transfusionais e as ações a nosso alcance para monitorar e diminuir o risco dessas intercorrências. Além disso, será abordado o modo como atuam os comitês transfusionais (CT), sua importância, suas funções, como implantá-los e qual a relação desses comitês com os núcleos de segurança do paciente (NSP) existentes nas instituições de assistência à saúde.
Dessa forma, esperamos contribuir para que você identifique a importância de seu papel na manutenção e no aperfeiçoamento do sistema de hemovigilância, bem como a importância dos CT atuantes, articulados aos NSP, para um ambiente assistencial mais seguro para todos os pacientes.
Foto: Adair Gomez [20--].
Primeiramente, é importante definirmos hemovigilância:
Conjunto de procedimentos de vigilância que abrange todo o ciclo do sangue, com o objetivo de obter e disponibilizar informações sobre os eventos adversos ocorridos nas suas diferentes etapas para prevenir seu aparecimento ou sua recorrência, melhorar a qualidade dos processos e produtos e aumentar a segurança do doador e do receptor (AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2015).
Para compreendermos a importância da hemovigilância no trabalho do responsável técnico (RT) em uma AT, partiremos de um caso clínico.
Antes de prosseguir, sugerimos que você pegue um papel e uma caneta, ou lápis, para ir tomando nota das informações à medida que surgirem e também de suas percepções e seus questionamentos.
Acompanhe com atenção o caso a seguir, clicando na ilustração e lendo o prontuário de uma paciente.
Supondo que você é a(o) enfermeira(o) que assiste a paciente, quais seriam suas primeiras condutas?
Observe as atividades e ordene-as no fluxograma a seguir. Ele deve representar a conduta diante da reação transfusional imediata, ou seja, na presença de qualquer sinal e/ou sintoma durante a transfusão, o que o enfermeiro deverá fazer.
Você pode agora clicar na imagem do fluxograma e baixá-lo para imprimir. Faça um bom uso dele, distribua para sua equipe, fixe no quadro de aviso ou simplesmente guarde-o para utilizar em um momento mais oportuno.
Agora, mudando de papel, supondo que você é o médico que foi chamado para atender a paciente, reflita sobre os diagnósticos diferenciais para o quadro de febre, calafrios e tremores durante a transfusão:
- O quadro clínico apresentado pode ter sido relacionado à doença de base da paciente?
- O quadro clínico apresentado pode ter sido uma reação transfusional?
- Quais os possíveis diagnósticos diferenciais, considerando a possibilidade de ter sido uma reação transfusional?
Para ajudar em sua reflexão, clique nos sinais e sintomas apresentados no quadro a seguir e que você consideraria indicativos de uma possível reação transfusional.
| Sinais e sintomas | Reação febril não hemolítica (RFNH) | Lesão pulmonar aguda relacionada à transfusão (TRALI) | Reação hemolítica aguda (RHA) | Reação de contaminação bacteriana (CB) |
|---|---|---|---|---|
| Os sinais e sintomas ocorrem em que momento da transfusão? | Geralmente ao final da transfusão e em até 2 horas após o término | Em 1- 6 horas, mais comum entre 1-2 horas | Após infusão de 50-100 mL | Durante ou até 8 horas do término da transfusão |
| Febre | Ocasionalmente frequente | Frequentemente presente | Frequentemente presente | Frequentemente presente |
| Calafrios | Frequentemente presente | Frequentemente presente | Frequentemente presente | Frequentemente presente |
| Sensação de frio | Frequentemente presente | Ausente | Ocasionalmente frequente | Ausente |
| Desconforto | Frequentemente presente | Ausente | Ausente | Ausente |
| Tremores | Ocasionalmente frequente | Ausente | Ausente | Ausente |
| Cefaleia | Ocasionalmente frequente | Ausente | Ocasionalmente frequente | Ausente |
| Náusea/vômito | Ocasionalmente frequente | Ausente | Frequentemente presente | Ocasionalmente frequente |
| Dispneia | Ocasionalmente frequente | Frequentemente presente | Frequentemente presente | Ausente |
| Cianose | Ocasionalmente frequente | Frequentemente presente | Frequentemente presente | Ausente |
| Dores (no trajeto venoso, lombar) | Ausente | Ausente | Frequentemente presente | Ausente |
| Coagulação intravascular | Ausente | Ausente | Frequentemente presente | Frequentemente presente |
| Hemoglobinúria | Ausente | Ausente | Frequentemente presente | Ocasionalmente frequente |
| Insuficiência renal | Ausente | Ausente | Frequentemente presente | Frequentemente presente |
| Hipotensão arterial/choque | Ausente | Frequentemente presente | Frequentemente presente | Frequentemente presente |
Fonte: Transfusion reactions (2012).
Depois de considerar os sinais e sintomas e refletir sobre os possíveis diagnósticos, você solicitaria algum exame laboratorial? Clique nos exames que você solicitaria para elucidar este caso e acompanhe os resultados atentamente.
Realização do GRAM e hemoculturas
Depois de dois dias, GRAM e hemoculturas parciais negativos
Normal
Normal, mas desnecessário
Normal
Normal
Ausência de hemoglobinúria
Negativa, mas desnecessária
Normal
Se achar necessário, utilize o menu de navegação para voltar ao início e recordar os detalhes do caso.
Mudando de papel, supondo que agora você é o técnico de laboratório da AT, clique nos testes que você realizaria para elucidar este caso e acompanhe os resultados atentamente. Lembre-se de que os testes pré-transfusionais têm que ser repetidos e que você vai utilizar as amostras pré e pós-transfusionais.
Retipagem ABO e RhD da bolsa transfundida:
A Positivo
Teste de antiglobulina direto (TAD) da amostra pré-transfusional:
Negativo para anti-IgG e para anti-C3
TAD da amostra pós-transfusional:
Negativo para anti-IgG e para anti-C3
PAI na amostra pré-transfusional:
Negativa
Para lhe auxiliar nessa análise, você pode consultar o material do Módulo 3.
A paciente permaneceu com acesso venoso com solução fisiológica isotônica, foi medicada com antitérmico e, após 10 minutos, apresentou melhora do quadro com desaparecimento de todos os sinais e sintomas.
A fim de fornecer mais subsídios para sua reflexão, vamos discutir um pouco mais sobre as reações transfusionais. Acompanhe!
Foto: Adair Gomez [20--].
Não podemos falar sobre hemovigilância sem abordar as reações transfusionais, uma vez que elas possuem papel central nessa discussão.
As equipes médica e de enfermagem devem estar atentas para os sinais e sintomas mais comumente relacionados às reações transfusionais:
Existem também sinais e sintomas comumente relacionados à gravidade da reação como:
Dentre as reações transfusionais, a RFNH e a reação alérgica (ALG) continuam sendo as mais comuns e as mais benignas.
Contudo, algumas reações são consideradas graves: reações transfusionais imediatas como reação hemolítica aguda por incompatibilidade ABO, lesão pulmonar aguda (TRALI), reação por contaminação bacteriana e sobrecarga circulatória (TACO) podem levar a óbito.
A seguir, veja como podemos classificar as reações. Trata-se de informação imprescindível para o diagnóstico.
As reações transfusionais são divididas de acordo com:
Fonte: Agência Nacional de Vigilância Sanitária (2015).
Depois de lermos sobre as classificações, o quadro a seguir traz os principais tipos de reação transfusional. Clique nas que estão em destaque para saber mais sobre cada uma.
Existem reações mais comuns, como RFNH e ALG, com desfechos clínicos mais benignos; mas existem reações mais raras como RHA, com desfechos clínicos mais graves.
No quadro a seguir, você pode ver a incidência das principais reações.
| Reação transfusional imediata | Reação transfusional tardia |
|---|---|
| Reação hemolítica aguda imune (RHAI) 1/40.000 - 1/1.800.000 |
Reação hemolítica tardia (RHT) 1/2.500 - 1/11.000 |
| Reação febril não hemolítica (RFNH) 0,1 - 1/100 com produtos desleucocitados |
Reação sorológica tardia/aloimunização eritrocitária (ALO/PAI) 1/100 |
| Reação alérgica (ALG) Alérgica: 0,5 -3/100 Anafilática: 1/20.000 - 1/50.000 |
Doença do enxerto contra o hospedeiro pós-transfusional (DECH) - GVHD pós-transfusional Menor que 1/1.000.000 |
| Reação hemolítica aguda não imune (RHANI) 2 - 6/100 em pacientes de risco |
Hemossiderose com comprometimento de órgãos (HEMOS) 100% dos politransfundidos, geralmente após 100 U de CH |
| Reação por contaminação bacteriana (CB) 1/3.000 - 1/25.000 |
Transmissão de outras doenças infecciosas (DT) Dependerá da doença |
| Lesão pulmonar aguda relacionada à transfusão (TRALI) 1/1.200 -1/90.000 |
Púrpura pós-transfusional (PPT) Rara |
| Sobrecarga circulatória associada à transfusão (SC/TACO) 1/100 |
|
| Reações metabólicas (RM) | |
| Reação hipotensiva relacionada à transfusão (HIPOT) Desconhecida |
|
| Dispneia associada à transfusão (DAT) Desconhecida |
|
| Dor aguda relacionada à transfusão (DA) 1/4.500 |
Fonte: Transfusion reactions (2012).
Cuidado! As complicações decorrentes das reações transfusionais podem causar o óbito dos pacientes.

Diante do que vimos até aqui, você consegue afastar a hipótese de RHA e de CB?
Para responder, você pode voltar ao início do caso ou consultar suas anotações.
Qual o diagnóstico mais provável de reação transfusional?
Muito bom!
Fique atento! Essa opção está excluída porque o caso relatado não preenche os critérios para CB. Leia mais informações no quadro que mostra os principais tipos de reação transfusional.
Fique atento! Essa opção está excluída, porque na RHA os sinais e sintomas tendem a ocorrer mais rapidamente, em poucos segundos ou minutos após o início da transfusão. Além disso, a paciente não apresentou sinais de hemólise, e os testes pré e pós-transfusionais eram compatíveis. Leia mais informações no quadro que mostra os principais tipos de reação transfusional.
Qual foi a gravidade da reação?
Parabéns! Ao escolher esta opção, você concluiu corretamente que a gravidade foi leve, ou seja, houve ausência de risco à vida, podendo ser requerida intervenção médica, mas a falta desta não resulta em danos permanentes ou em comprometimento de órgão ou função.
Atenção! Reveja sua resposta. Ao escolher esta opção, você concluiu que a gravidade foi moderada, ou seja, com morbidade a longo prazo e que, em consequência da reação transfusional, houve:
- necessidade ou prolongamento de hospitalização e/ou
- deficiência ou incapacidade persistente ou significativa ou
- necessidade de intervenção médica ou cirúrgica para evitar danos permanentes ou comprometimento de órgão ou função.
Atenção: reveja a sua resposta. Ao escolher esta opção você concluiu que a reação foi Grave e que houve ameaça imediata à vida, em consequência da reação transfusional, sem óbito atribuído à transfusão. Intervenção médica foi exigida para evitar a morte.
Atenção: reveja a sua resposta. Ao escolher esta opção você concluiu que ocorreu óbito atribuído à transfusão.
Nota sobre o caso
A paciente permaneceu com acesso venoso com solução fisiológica isotônica, foi medicada com antitérmico e, após 10 minutos, apresentou melhora do quadro com desaparecimento de todos os sinais e sintomas.
Qual foi a correlação com a transfusão?
Parabéns! Ao escolher esta opção, você corretamente concluiu: ausência de outras causas que possam explicar os sinais e sintomas descritos na definição de caso, tais como CB, reação hemolítica ou outra condição subjacente.
Atenção! Reveja sua resposta. Ao escolher esta opção, você concluiu: a investigação já concluída, ou ainda em curso, apresenta evidências (quadro clínico/laboratorial e vínculo temporal) que indicam a correlação com a transfusão, mas há outras causas que podem explicar os sinais e sintomas descritos na definição de caso.
Atenção! Reveja sua resposta. Ao escolher esta opção, você concluiu: a investigação já concluída, ou ainda em curso, apresenta evidências (quadro clínico/laboratorial/evolução e vínculo temporal) que indicam a correlação dos sinais e sintomas descritos na definição de caso a outras causas, mas a correlação com a transfusão não pode ser descartada.
Atenção! Reveja sua resposta. Ao escolher esta opção, você concluiu: a investigação já concluída, ou ainda em curso, apresenta evidências claras (quadro clínico/laboratorial/evolução e vínculo temporal) que indicam a correlação do evento adverso a outra(s) causa(s), mas a correlação com a transfusão não pode ser descartada.
Atenção! Reveja sua resposta. Ao escolher esta opção, você concluiu: não há evidências (quadro clínico/laboratorial/evolução) suficientes para confirmar ou descartar a correlação com a transfusão.
Atenção! Reveja sua resposta. Ao escolher esta opção, você concluiu: a investigação já concluída apresenta evidências (quadro clínico/laboratorial/evolução e vínculo temporal) que indicam claramente a correlação do evento adverso a outra(s) causa(s), como uma CB, ou outras reações, ou ainda à doença de base.
Nota sobre o caso
A paciente nega uso de medicamentos e quadro infeccioso.
Depois de dois dias, GRAM e hemoculturas parciais negativos.
Muito bem! Você diagnosticou uma reação transfusional. E agora? Qual o próximo passo?
No caso que estudamos anteriormente, você deveria notificar ao Notivisa até o 15º dia útil do mês subsequente.
Clique na imagem para vermos o passo a passo sobre como fazer.
Você saberá mais sobre o Notivisa no Módulo 6 da Unidade de Aprendizagem III.
Diante do diagnóstico de uma reação transfusional, devo comunicar ao CT?
Foto: Adair Gomez [20--].
São competências do CT o monitoramento da prática hemoterápica na instituição de assistência à saúde visando ao uso racional do sangue, a atividade educacional continuada em hemoterapia, a hemovigilância e a elaboração de protocolos de atendimento da rotina hemoterápica.
O CT do serviço de hemoterapia ou da instituição de assistência à saúde será informado e monitorará as reações transfusionais ocorridas, zelando pelo atendimento e pela notificação dessas reações.
Você sempre deve comunicar ao comitê as intercorrências nas transfusões? Aprofunde essa discussão no fórum deste módulo.
Faça o download do texto complementar e leia atentamente sobre organização/estrutura, objetivos, características e funções dos comitês.
Dando um desfecho ao caso, você, na posição de RT da AT, poderia tomar algumas medidas preventivas para evitar reações como essas.
A fisiopatologia da RFNH é resultado da presença de leucócitos ou de interleucinas liberadas pelos leucócitos na bolsa do hemocomponente, sendo a remoção de leucócitos a medida preventiva mais eficiente. O método utilizado é o filtro de remoção de leucócitos, isto é, fornecer produto desleucocitado a partir das próximas transfusões. De preferência, deve-se utilizar filtro de remoção de leucócitos de bancada, mas, na ausência deste, poderia ser utilizado o filtro de remoção de leucócitos à beira-leito.
Para saber mais sobre esse e outros diagnósticos, leia o material indicado.
Manual técnico de hemovigilância: investigação das reações transfusionais imediatas e tardias não infecciosas(AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA, 2007).
1Período de realização
Atividade individual
Fórum de discussão
Vamos supor agora que você é um membro do CT. Analise o caso descrito a seguir, observando que ele tem uma evolução diferente do mesmo caso que acabamos de estudar.
Como exercício, monte o dossiê de investigação deste caso, utilizando o modelo disponibilizado como material complementar. Utilize as informações que obteve para embasar seus argumentos no fórum que está apresentado no fim deste material.
Algumas horas depois, a paciente evoluiu para instabilidade hemodinâmica e óbito.
Como membro do CT, você participou de uma investigação minuciosa.
Leia a seguir o que você apurou:
Ainda se colocando no papel de membro do CT, termine de preencher seu dossiê e envie para o tutor. Em seguida, participe do fórum, discutindo com seus colegas sobre os seguintes aspectos:
Tipo de incidente: justifique seu diagnóstico com os fundamentos teóricos adquiridos no estudo do módulo e da bibliografia.
Não conformidades observadas: relacione todos os procedimentos do ato transfusional que impactaram e contribuíram para o desfecho.
Descrição da atuação do CT: relacione as medidas corretivas e preventivas que o CT deveria tomar neste caso.
Vamos ao debate!
AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA (Brasil). Manual técnico de hemovigilância: investigação das reações transfusionais imediatas e tardias não infecciosas. Brasília, DF, 2007.
AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA (Brasil). Marco conceitual e operacional de hemovigilância: guia para a hemovigilância no Brasil. Brasília, DF, 2015.
BRASIL. Ministro da Saúde. Portaria n. 158, de 4 de fevereiro de 2016. Redefine o regulamento técnico de procedimentos hemoterápicos. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 fev. 2016. Seção 1, p. 37.
Site consultado: <http://portal.anvisa.gov.br/notivisa>